Há muito tempo que entrar em qualquer lugar em Paris para comer
não significa necessariamente comer beeeeem. Muitas vezes só o enlevo de estar
por lá, e o charme completado pelas
nossas próprias fantasias, dão conta de suprir a “palidez” da comida .
Nas últimas crônicas
escritas por Danuza Leão na Folha de SP ela se refere a recentes experiências
ruins comendo em Paris. E parece que de repente a história da comida congelada
nos restaurantes franceses tomou conta da mídia. É certo que isso vem acontecendo,
tanto que há um projeto de lei
transitando no Senado francês, já foi votado na Assembléia, exigindo que os
restaurantes sejam obrigados a mencionar no menu, “produtos frescos”,
“congelados” ou “feitos na casa” para distinguir o joio do trigo. A briga promete
ser feia até que a proposta entre em vigor !
Mas os bons bistrots ainda existem!!! Basta
saber onde procurá-los.
Para conhecê-los é de grande ajuda um livro que saiu no ano
passado - Bistrot - Autour et avec les recettes de Paul Bert - de Bertrand
Auboyneau ( “patron” desse bistrot , que leva o mesmo nome da rua onde se
encontra) e François Simon o mega critico
gastronômico francês.
De aperitivo uma fala de
Simon: bistrot é “um tipo de parênteses” na nossa vida racional, cotidiana.
Bien sûr !
O livro começa reverenciando Michel
Picquart, considerado o “pai” dos
bistrots parisienses.
Certo dia na década de 80, Picquart decidiu que não gostava do seu
trabalho e resolveu mudar de área. Comprou um velho restaurante do bairro o
Astier, onde começou a aprender o métier e tomou gosto. Anos depois, em 1995 , humanista
convicto, vendeu aos empregados e partiu
para um segundo , o Le Villaret, onde reinou como um ícone indefectível da alma
bistrotière. A casa durante anos nem precisava
exibir o nome na porta. Fazia parte da vida dos freqüentadores do bairro e
clientes. Sob o seu olhar e gestão esses dois lugares se tornaram referência
absoluta na bistrologia parisiense. Picquart é o responsável pelo primeiro menu-carte de
Paris pois sempre defendeu ” comer bem a preço justo” , acompanhado de vinhos bons e acessíveis . Foi
o “professor” para vários chefs atuantes
nessa área, e sem ele não haveria Bistronomie
atesta Yves Camdeborde responsável pela entrada dos bistrots na moda ,com a
abertura do seu Régalade em 1992.
Picquart morreu em 2006.
L'Ecailler du Bistrot - foto do livro |
No livro François Simon enuncia as características e competências
essenciais que norteiam um bom bistrot, as 10 “regras de ouro”, com clareza e
bom humor. O “patron”, é quem dá
personalidade ao lugar, e deve receber a todos com um sorriso caloroso, o chef que
é quem executa com maestria os desejos do “patron”,
a comida que muda ao sabor das compras do dia e das estações e por isso vem
enunciada na lousa , o vinho que tem que ser bom e acessível. Segue falando das
pessoas que servem sem as quais o bistrot não ”viveria”, são elas que fazem a
ligação essencial com os clientes . Muito do astral dessas pessoas, sua
alegria, eficiência e o orgulho com que
exercem o seu trabalho influem na qualidade do lugar. A mesa, a decoração e a atmosfera, os
clientes que se confraternizam num bem-estar comum e os aromas reconfortantes que
passam pelo salão completam a lista.
O livro traz receitas clássicas servidas no Paul Bert, e também
agrupa por critérios afetivos uma lista de
casas . Amizade, generosidade e cumplicidade são o denominador
comum desses lugares que Bertrand Auboyneau e François Simon amam
acima de tudo.
Apontam-nos aí um bom caminho para pesquisas gourmandes. Estão lá o Baratin, o L’Ami
Jean, o Le Verre Volé, claro o Villaret, o midiático Comptoir, mais uma meia
dúzia de outros. E o mais novo do grupo, o Phillou, que conheci na minha última
viagem.
Phillipe Damas , ex dono do Square Trousseau, montou essa nova
casa num quartier agradável, ao lado do canal de St Martin, região que vem
sendo ocupada por lojas bacanas e gente animada. Recolocando o novo negócio
numa dimensão mais afetiva, escolheu Philou, seu apelido, para dar nome a casa.
O espaço fica entre o clássico e o moderno, com banquetas
vermelhas e paredes de quadro negro onde
o menu está escrito. Tem um pequeno bar redondo no centro da sala e uma
luminária de Ingo Maurer , aquela que prende um monte de papéis, estes aqui cheios
de mensagens afetuosas dos amigos. Do lado de fora um bom terraço, à sombra de
um toldo vermelho é daqueles lugares deliciosos , disputado pelos clientes .
No dia em que fomos, Phillipe estava lá para nos receber e
acomodar na mesa . Antes de qualquer coisa já nos propõe um verre de vinho , recém descoberto, para “matar a sede”, que com certeza não vai pesar no nosso bolso.
No menu pratos deliciosos feitos com ingredientes do dia como o
tartare de vieiras e ostras com maçã verde, que não resisti e pedi nas duas
vezes que visitei o restaurante de tão refrescante e gostoso que estava. Era outono,
onde a caça é habitual por isso o faisão rôti
com endívias caramelizadas foi a pedida mais certeira. Outra maravilha ! Também
o Joue de boeuf com blettes fondants, bochecha , uma carne
que foi “redescoberta” , montada num prato simples mas perfeito. De sobremesa o
Montblanc, creme de castanhas com sorvete e outra, marmelos servidos com
sorvete de chá verde estavam fantásticos.
Philou é desses lugares que ainda temos a sorte de encontrar.
Phillipe, conforme a noite foi correndo, mais relaxado, teve tempo
de beber um copo conosco na mesa, partilhando histórias e afetos.
Esse grupo de ótimos endereços, onde se come bem, e faz com que saiamos reconfortados e felizes, nos assegura , ainda bem, que “vai sempre existir Paris para nós” * !
Philou
12, av. Richerand
10eme
Tel 01 42 38 00 13
Menus: 25€ (almoço), 30€ (jantar)
Tel 01 42 38 00 13
Menus: 25€ (almoço), 30€ (jantar)
Metro : Jacques Bonsergent
Bistrot Paul Bert
18, rue Paul Bert,11 eme.
01 43 72 24 01
18, rue Paul Bert,11 eme.
01 43 72 24 01
Metro : Faidherbe Chaligny
Bistrot. Autour et avec les recettes du
Paul Bert
Bertrand Auboyneau et François Simon
Ed Flammarion, 30 €.
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