2.2.12

Parênteses de Paris



Há muito tempo que entrar em qualquer lugar em Paris para comer não significa necessariamente comer beeeeem. Muitas vezes só o enlevo de estar por lá, e o charme completado  pelas nossas próprias fantasias, dão conta de suprir a “palidez” da comida .

Nas últimas  crônicas escritas por Danuza Leão na Folha de SP ela se refere a recentes experiências ruins comendo em Paris. E parece que de repente a história da comida congelada nos restaurantes franceses tomou conta da mídia. É certo que isso vem acontecendo, tanto  que há um projeto de lei transitando no Senado francês, já foi votado na Assembléia, exigindo que os restaurantes sejam obrigados a mencionar no menu, “produtos frescos”, “congelados” ou “feitos na casa” para distinguir o joio do trigo. A briga promete ser feia até que a proposta entre em vigor !

Mas os bons bistrots ainda existem!!! Basta saber onde procurá-los.


Para conhecê-los é de grande ajuda um livro que saiu no ano passado - Bistrot - Autour et avec les recettes de Paul Bert - de Bertrand Auboyneau ( “patron” desse bistrot , que leva o mesmo nome da rua onde se encontra) e François Simon o mega critico  gastronômico francês.

De aperitivo  uma fala de Simon: bistrot é “um tipo de parênteses” na nossa vida racional, cotidiana. Bien sûr !

O livro começa reverenciando Michel Picquart,  considerado o “pai” dos bistrots parisienses.

Certo dia na década de 80, Picquart decidiu que não gostava do seu trabalho e resolveu mudar de área. Comprou um velho restaurante do bairro o Astier, onde começou a aprender o métier e tomou gosto. Anos depois, em 1995 , humanista convicto,  vendeu aos empregados e partiu para um segundo , o Le Villaret, onde reinou como um ícone indefectível da alma bistrotière. A casa durante anos nem precisava exibir o nome na porta. Fazia parte da vida dos freqüentadores do bairro e clientes. Sob o seu olhar e gestão esses dois lugares se tornaram referência absoluta na bistrologia parisiense. Picquart  é o responsável pelo primeiro menu-carte de Paris pois sempre defendeu ” comer bem a preço justo” ,  acompanhado de vinhos bons e acessíveis . Foi o “professor” para vários chefs  atuantes nessa área, e sem ele não haveria Bistronomie atesta Yves Camdeborde responsável pela entrada dos bistrots na moda ,com a abertura do seu Régalade em 1992.  Picquart morreu em 2006.

L'Ecailler du Bistrot - foto do livro

No livro François Simon enuncia as características e competências essenciais que norteiam um bom bistrot, as 10 “regras de ouro”, com clareza e bom humor. O “patron”, é quem dá personalidade ao lugar, e deve receber a todos com um sorriso caloroso, o chef que é quem executa com maestria os desejos do “patron”, a comida que muda ao sabor das compras do dia e das estações e por isso vem enunciada na lousa , o vinho que tem que ser bom e acessível. Segue falando das pessoas que servem sem as quais o bistrot não ”viveria”, são elas que fazem a ligação essencial com os clientes . Muito do astral dessas pessoas, sua alegria,  eficiência e o orgulho com que exercem o seu trabalho influem na qualidade do lugar. A mesa, a decoração e a atmosfera, os clientes que se confraternizam num bem-estar comum e os aromas reconfortantes que passam pelo salão completam a lista.



O livro traz receitas clássicas servidas no Paul Bert, e também agrupa por critérios afetivos  uma lista de casas . Amizade, generosidade e cumplicidade são o denominador comum desses lugares que Bertrand Auboyneau e François Simon amam acima de tudo.

Apontam-nos aí um bom caminho para pesquisas gourmandes. Estão lá o Baratin, o L’Ami Jean, o Le Verre Volé, claro o Villaret, o midiático Comptoir, mais uma meia dúzia de outros. E o mais novo do grupo, o Phillou, que conheci na minha última viagem.



Phillipe Damas , ex dono do Square Trousseau, montou essa nova casa num quartier agradável, ao lado do canal de St Martin, região que vem sendo ocupada por lojas bacanas e gente animada. Recolocando o novo negócio numa dimensão mais afetiva, escolheu Philou, seu apelido, para dar nome a casa.

O espaço fica entre o clássico e o moderno, com banquetas vermelhas e paredes de quadro negro onde  o menu está escrito. Tem um pequeno bar redondo no centro da sala e uma luminária de Ingo Maurer , aquela que prende um monte de papéis, estes aqui cheios de mensagens afetuosas dos amigos. Do lado de fora um bom terraço, à sombra de um toldo vermelho é daqueles lugares deliciosos , disputado pelos clientes .



No dia em que fomos, Phillipe estava lá para nos receber e acomodar na mesa . Antes de qualquer coisa já nos propõe um verre de vinho , recém descoberto,  para “matar a sede”, que com certeza não vai pesar no nosso  bolso.


No menu pratos deliciosos feitos com ingredientes do dia como o tartare de vieiras e ostras com maçã verde, que não resisti e pedi nas duas vezes que visitei o restaurante de tão refrescante e gostoso que estava. Era outono, onde a caça é habitual por isso o faisão rôti com endívias caramelizadas foi a pedida mais certeira. Outra maravilha ! Também o Joue de boeuf com blettes fondants, bochecha , uma carne que foi “redescoberta” , montada num prato simples mas perfeito. De sobremesa o Montblanc, creme de castanhas com sorvete e outra, marmelos servidos com sorvete de chá verde estavam fantásticos.


Philou é desses lugares que ainda temos a sorte de encontrar.
Phillipe, conforme a noite foi correndo, mais relaxado, teve tempo de beber um copo conosco na mesa, partilhando histórias e afetos.

Esse grupo de ótimos endereços, onde  se come bem, e faz com que saiamos reconfortados e felizes, nos assegura , ainda bem, que “vai sempre existir Paris para nós” * !


Philou
12, av. Richerand  10eme
Tel 01 42 38 00 13
Menus: 25€ (almoço), 30€ (jantar)
Metro : Jacques Bonsergent

Bistrot Paul Bert
18, rue Paul Bert,11 eme.
01 43 72 24 01
Metro : Faidherbe Chaligny

Bistrot. Autour et avec les recettes du Paul Bert
Bertrand Auboyneau et François Simon
Ed Flammarion, 30 €.

* Frase tirada do filme “Casablanca” que Danuza usou na crônica dela.














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