Há quem persiga o poder, o dinheiro, a fama. Eu persigo a beleza. Não é
uma escolha. É uma condenação. Sem beleza faleço. É um trabalho difícil, muitas
vezes doloroso, cheio de revezes. Já passei dias e dias com as mãos na garganta
apavorado que ela não volte a visitar-me. É difícil dizer o que é aquela
poderosa presente ausência que nos oprime e agarra. Nunca está onde está, mas
sempre um pouco mais longe, noutro sítio. Não são cores, imagens, sons, nem
sequer a suave pele de uma mulher que me encantam. É o que está para além disso
e que isso chama. A beleza corre o permanente perigo de a qualquer momento se
desfazer em nada. É, na verdade, por completo insustentável. Não se pode medir,
calcular, torná-la obedientemente exacta. É impossível provar que existe. Daí a
urgência, o coração a bater na boca. A perseguição da beleza é uma corrida de
obstáculos sem meta de chegada. Basta o som de uma voz para rasgar futuros.
Basta uma fotografia de uma mala fechada sobre uma cama para abrir
horizontes. Todos os cuidados são insuficientes. É um trabalho longo preenchido
de mistérios. Se se procura controlar, escapa. Se se procura guardar, esvai-se
entre os dedos. Tem de ser roubada com toda a rapidez e mantida no movimento
que é só dela. Se se tenta parar, fixar, já não vale a pena. O dinheiro tem
certamente as suas vantagens. Uma das poucas coisas que serve para várias. E a
beleza não serve de nada. Atrapalha. Provoca desastres nas famílias,
intoxica-nos até ao desmaio, não poupa nada. Devia ser proibida. É um escândalo
no meio do mundo. É a causa do espantoso medo que é perdê-la. Não escolhi ser
quem sou, este vício de que sou escravo. O que mais importa ninguém escolhe. Já
tentei ser tantos para escapar de mim, para me desviar desta vida que me deram.
E depois vem a beleza. Surpreendente ao virar de uma esquina. Um desejo marcado
no ponto de encontro do aeroporto onde ficaremos para sempre abraçados. A tomar
duche à minha frente. A irromper do nada. A primeira coisa que um qualquer
fanatismo sabe que tem a fazer é demolir com a beleza. Com todo o direito, de
todas as maneiras. A beleza semeia a desordem nas almas e nos corpos que anima.
A beleza alimenta-se de uma liberdade particularmente virulenta. É
impertinente. Não conhece regras. Vive da vida e de mais nada.
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