27.7.12

Urgências inadiáveis

Egon Schiele - LiebespaarLápis, aquarela e guache sobre papel - 1913

As coisas não pareciam andar muito bem naquele dia. Mas , estava difícil se concentrar.

Na lista de compras do mercado havia esquecido de anotar o principal, amêndoas e limão.
Como é que  poderia fazer a receita que tinha prometido aos amigos para o jantar ?

Chegara atrasada à reunião que teoricamente dividiria sua  vida profissional em antes e depois. Não foi por descaso, nem imprudência. Os táxis passavam lotados , a chuva não parava de cair e ela teve que caminhar por 10 longas quadras com os sapatos encharcados para chegar, completamente destruída, ao local do encontro.

Todos a olharam esquisito quando apareceu na sala. Nem adiantava se desculpar, era só montar a cara de experiente e  rezar para que a oportunidade “de ouro” não tivesse se esvaído pelos vãos das pedras da rua junto com a chuva.

A urgência do encontro a tirava do sério. Todo o resto da vida virara coadjuvante, tempo a ser preenchido até o momento imaginado, idealizado, saboreado , muito antes de se fazer real.

Uma amiga tentou conversar sobre isso. Não deixou nem que ela terminasse a frase.  Só ela entendia o que era essa paixão que lhe consumia ossos, pele, e carne , e tinha uma parte divina escondida na matéria fluida que alguns chamariam de alma.

Sempre marcaram encontros longe de tudo e de todos.Não podiam imaginar que alguém pudesse ousar dividir a atenção tola de um para o outro.

Certa vez, perto do mar, ele parara a bicicleta no meio da rua para  abraçá-la e, beijando-a sem parar chorava dizendo quanto estava apaixonado,.  

Essa lembrança sempre a fazia sorrir,  associada a lançamentos no espaço . Lançamentos suicidas até que o para-quedas  abrisse, e, depois do tranco, viesse o calor que invadia os dois corpos, que fervendo, suando, babando, lambiam urgências inadiáveis.

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